Marcado um fim-de-semana inteiro para vasculharmos uma ZCT, o pretexto era ver se tínhamos interesse em ficar com as Galinholas dessa Herdade.
Com cães e mulheres rumamos ao Alentejo para caçarmos e passarmos 2 dias.
A zona era essencialmente de estevas e montado, pouco, pois as árvores aos poucos e devido à doença dos sobreiros têm vindo a ser cortadas.
Já na Herdade as expectativas caíram a pique, não pelas condições da herdade, mas sim pelas condições meteorológicas, o carro ao passar, em vez de patinar em caminhos enlameados pelas chuvas devidas, deixava atrás de si um rasto de pó tão grande como a minha fraca expectativa em ver ali naquele dia algum pássaro de bico.
Começámos a caçar nas encostas mais sombrias de Estevão, demasiado fechadas mas com condições de meter um ou outro pássaro, os cães coitados sofriam para conseguirem caçar numa zona tão áspera.
Eu tentei colocar-me no lugar de uma Galinhola e pensar como elas e, comecei por uma zona que me parecia mais apropriada para ter um pássaro, o cão sem chocalho lá ia lutando com estevas bem maiores que ele, pouco depois levanta-se uma, larguíssima sai para trás junto a uma pequeno vale, sem sequer o cão a ver ou sentir, longe, longe, o pássaro que até hoje se levantou mais longe, demasiado áspera, arraçada de perdiz talvez.
Como a mancha acabava ali perto decido deixa-la sossegada e continuar mais um pouco, procurando por ela na volta.
No regresso recebo uma mensagem com uma foto de um pássaro, o Jorge tinha morto uma. Eu tinha uma ali á minha espera, mas tinha de ir ao carro dar água ao cão e eu próprio beber água. Já no carro combino com o Jorge ir-mos lá ver da minha que andava a monte, trocamos de cães, pois aqueles que já tinham saído estavam derreados.
Ela estava ali perto, ao delinearmos a estratégia num cruzamento de um caminho da herdade, vimos a Galinhola a levantar sozinho a uns 200 metros de nós, impressionante, como era áspera aquela Galinhola, ainda tentamos mas não a vimos.
A partir daqui nada mais teve grande história, apenas umas codornizes paradas pelo Faruck e um ou outro Javardo enorme que vimos passear-se indiferente a cães e caçadores.
No dia seguinte acordamos com um telefonema do Baguinho, que antes mesmo de termos tomado o pequeno-almoço, já Baguinho ofegante mas em tom de gozo nos dizia que tinha já aquela hora duas Galinholas abatidas, meu Deus, só me apeteceu meter de novo na cama!
O Jorge ria-se, que remédio, nós tão longe a penar e o Baguinho perto de nossa casa com 3 pássaros, mais tarde viemos a saber que ele ainda tinha errado uma terceira num lance caricato.
Certamente Baguinho é forte candidato como dizia Manél Brás, a Becadero do ano.
Nós fomos para o campo, eu pelo menos com a convicção que pelo menos aquela minha dissidente estaria á minha espera, mas não, nem essa!
Terreno duros, de muita esteva e sequíssimos, foi o que nos foi apresentado, mas que numa nova surtida mais para a frente, depois da chuva e da Conceição teremos de vasculhar com outros olhos e outras expectativas. Até lá mais caçadas noutras paragens e muita Terramicina nas patas dos cães.
A reter a boa hospitalidade e comida Alentejana, acho que vim mais gordo!
Mais do mesmo.
Esta pequena frase tem ditado todas as minhas ultimas jornadas em busca da Bela Dama, não sei se é caso para me desapontar, afinal não é mais do que se passou na época passada onde apenas fiz o primeiro abate dia 1 de Dezembro, esta época até ver está em todo igual à transacta. O tempo esse parece fotocopia, pouco frio, nenhuma chuva, nos países de Leste da Europa demasiado encalorados para que os pássaros se metam ao caminho, todas estas condições reunidas são o bastante para que seja certamente um época fraca, onde os pássaros se vão dispor em zonas menos habituais.
Francamente as minhas expectativas para esta jornada não eram as melhores, apesar da zona de caça ser a nossa melhor zona, onde muitos de nós fizeram o maior número da contabilidade final. Não estava muito confiante, para dizer a verdade não estava nada confiante numa jornada com abates. A madrugada começava com o vislumbre de um pássaro que na hora típica se cruzou comigo na estrada, ela vinha talvez a chegar de uma viagem longa, eu ia agora ao encontro de algumas companheiras suas de viagem.
A jornada começava esta época no mesmo local que começamos a anterior, onde há 1 ano também na abertura um companheiro tinha abatido 3 pássaros, mas infelizmente, ou não, na caça não há dois dias iguais.
O terreno seco transmitia-nos a certeza que ali não deveria estar pássaro nenhum, apenas pombos, muitos pombos que ao deixarem as árvores nos davam a sensação de uma Galinhola a levantar, aquela sensação que já me faz falta.
Zona após zona, tudo batido minuciosamente sem a presença de qualquer Galinhola, decidimos então mudar de mancha. Era hora de ir ao local que baptizamos como o “tem Sempre” a que eu e o Carlos chamamos o “cantinho do Faruck” pois ali naquela pequena mancha sempre vimos Galinholas e também ali vá-se lá saber porquê o Faruck dá largas á sua Paixão e inventa pássaros, desta vez não foi muito diferente, o Cantinho mágico uma vez mais não nos defraudou e fez jus ao nome que lhe demos, assim como o Cão, parecia saber onde pisava, dava a entender que conhecia todos os recantos, todos os sargaços, que tratava todos os chaparros por tu. Entra na melhor parte da mancha e descai à direita, rapidamente ou melhor a galope forte e convicto como lhe é característico faz uma linha recta direito a um pássaro, parecia que já sabia onde este se encontrava pois fez uma busca recta, directa e sem hesitação até ficar parado com a sua primeira Galinhola da época, mas um pássaro talvez recente num terreno seco não quis esperar que me acerca-se e ainda antes do primeiro cantar do Beeper levantou á frente do cão, que impávido e sereno ficou a vê-la ir, movendo só a cabeça acompanhando aquele gracioso movimento de asas. Não mais demos com ela, evaporou-se.
Um almoço farto com leitão de Javali, escalopes de Veado, acompanhado de bons queijos e regado com bom tinto e as inevitáveis histórias de outras jornadas foi o ponto alto de uma jornada fraca de pássaros.
A volta foi a do costume, entrámos na mancha, Eu á direita o Jorge á esquerda, de forma a batermos a zona o melhor possível, pouco depois de entrarmos na mancha vi sair uma Galinhola larga e, foi o bastante para começarmos a jornada com outro animo e uma outra certeza, pelo menos um pássaro estava lá.
Decidimos ir ao encontro dela, sabia-mos que não poderia estar muito longe, pois as manchas devido a um grande desmate feito no verão, ficaram reduzidas o que nos facilitava um pouco a tarefa, pouco depois ouço o cantar do Beeper, o Faruck estava parado, novamente aquela sensação inexplicável de ouvir aquele som, a melhor forma de o descrever quando o ouço, é iguala-lo ao cantar de uma sereia chamando a si bravos marinheiros que, incapazes de dizer não encurtam o caminho para chegar o mais breve possível ao som do encantamento. É assim que eu me sinto quando ouço o Beeper tocar naquele Mar de pinhal. Apressei-me e corri levando á minha frente tojos e urze como se nada pudesse intrometer-se entre mim e o cão, mas ainda assim não foi o suficiente, ela já tinha saído novamente a pés, o cão esse não se deixou abalar por isso e continuou no seu galope forte na rebusca do pássaro, algo onde ele é bastante bom, em encontrar pássaros depois de levantados. Mais á frente por estupidez minha ou talvez por estranhamente não estar ali naquela hora e andar no campo a pensar em tudo menos no pássaro deixei o cão sem apoio fazer um rasto no final da mancha, junto do corta fogo, sabendo á partida que só podia estar ali e que iria pela zona que estava levantar e, assim foi, levantou mesmo para desta vez não a vermos mais.
De regresso ao carro o cão pelo aceiro fora fica parado num pequeno caminho que cruza o terreno, eu corro mas ainda sem o beeper chegar a tocar levanta outro pássaro, que atiro por descargo de consciência, mas errei-a inevitavelmente, chamo o Jorge e com ele decido rebuscar este pássaro, tinha noção onde ele poderia estar e estava, o Aron o Braco novo do Jorge pára-a, ela sai como ele costuma dizer quase tipo borboleta, e eu a ver tudo vejo o incrível, ele a errar aquele pássaro. Depois novamente Faruck de nariz no chão a fazer o rasto como ele bem sabe, com uma rapidez incrível, eu conhecendo o cão apenas digo ao Jorge, ela vai á frente do cão e vai levantar, assim foi, levanta numa pequena descida e eu atiro por medo, alto, pois o cão correu atrás e tapou a ave, o Jorge também a erra. Novamente o Faruck no mesmo enfiamento faz mais do mesmo, mas ela já devia ter levantado novamente, fui dar com ela na ponta da mancha, na zona mais normal e onde teria de estar, eu estupidamente deixei novamente o cão sem apoio, ele fez o trabalho dele, no rasto entre um rebuliço de tojo, ela levanta sem eu esperar e roda para trás, fiz 2 tiros pedindo a Deus que fizesse ali mesmo um milagre, mas o Deus do pássaro era mais poderoso que o meu, erro-a pela terceira vez, por culpa minha, pois devia ter apoiado o cão e da forma como saiu se tivesse eu a trabalhar em equipa ela tinha caído ali! Mas há dias em que não estamos com a cabeça na terra.
O pássaro acaba sim por levantar perto da calibre 20 do Jorge que finalmente a manda ao chão. Estava gorda e pela forma como fez a faena era pássaro que já tinha chegado á algum tempo, nenhum pássaro novo no terreno nos ludibria daquela forma.
Mais pelo cão que pelos abates, mas hoje não era dia para eu matar pássaro, quando a cabeça não acompanha o corpo não vale a pena, apenas o cão me deu mais uns momentos daqueles especiais, daqueles capazes de me libertar um pouco, fiquei contente pelo Jorge que teve nesta manhã a primeira paragem do Aron a uma Galinhola, aos poucos começa a fazer os cães novos, nesta fase isso é importantíssimo!
Por vezes não há palavras para descrever aquilo que sentimos em determinados instantes da vida, por vezes uma simples sensação vivida por um Homem contém tamanha intensidade que se torna de difícil descrição. Sem saber se conseguirei descrever uma manha de Galinholas, vou pelo menos tentar relatar á minha maneira os lances e acontecimentos tão intensamente vividos por dois Amigos becaderos.
Pouco passava das 6.45h, hora combinada com a devida antecedência com o meu companheiro de caça Baguinho, já ele estava á minha espera no local do costume, apenas as nossas viaturas se encontravam na zona habitual onde deixamos os carros, era para já um bom indicio, os “Talibãs” ainda não tinham chegado, ou não vinham ou chegariam mais tarde. Depois de chocalhos e beepers colocados nos cães, farnel no colete, lá fomos nós em busca da nossa Bela Dama.
Não sei dizer quais eram ao certo as minhas reais expectativas, as jornadas anteriores tinham sido madrastas para mim, alguns pássaros vistos, alguns lances bonitos do cão desaproveitados e alguns tiros errados, tinham sem duvida deixado a moral algo em baixo, claro que não me deixo abater facilmente por contrariedades da vida, muito menos por estas simples contrariedades cinegéticas, talvez a minha grande paixão por esta caça me leve a viver as coisas de uma forma mais intensa, os lances perdidos são um drama e os concretizados de belo efeito são levados ao extremo.
Entramos na mancha pela zona habitual, eu como sempre e respeitando a vontade do Baguinho, mais velho e senhor daquele Pinhal, deixei-o escolher o lado que preferia fazer, ele á esquerda como é habitual e eu á direita, lá fomos em busca de tão belo ser.
A primeira volta seria aquela que mais promessas nos daria, mas, embora a forte convicção do Baguinho que repetia “tem de estar aqui um pássaro” caísse por terra ao chegar-mos ao final da mancha sem nenhum levante. Por comum acordo decidimos ir em busca de um pássaro que andava a monte desde a passada quinta feira. Não demorou muito a eu ver o pássaro cruzar num voou esplendoroso a mancha, furtando-se assim ao Baguinho e seus cães que nem a viram, ouviram ou sentiram. Vi onde ela tinha pousado, estava numa pequena clareira no centro de uma mancha de espinhosos Tojos, chamo o cão, o coração bate, sabia onde estava um pássaro que não me vira. O cão da um toque, levanta aquela cabeça tentando perceber de onde vinha a emanação, pois ela tinha pousado repentinamente e por ali não havia rastos, apenas uma ténue emanação dissimulada pela ausência de vento mas que o cão começara a captar, ela senhora daqueles terrenos, sem demora levanta-me já nas costas, saiu tapada por um pinheiro que naquele dia se sentia o guardião da Dama, mas que por minha fortuna não foi capaz de a defender de um tiro da minha bela Justaposta, a Dama tomba, o cão depressa corre para cobrar, uns segundos intermináveis e o cão sem dar com ela, começo a desesperar e chamo o Baguinho para me ajudar a desvendar o enigma, onde estava a minha Dama? Finalmente o Faruck começa a remontar direito a um rebolo de tojo, ela caíra dentro do tojo, o cão fez um trabalho magnífico para cobrar a minha primeira Galinhola da época. Baguinho como sempre felicita-me com um aperto de mão sentido, selando ali o lance.
Decidimos então ir numa outra direcção, em busca de outros terrenos que talvez albergassem nas suas entranhas um ou outro pássaro.
Fomos pelo caminho mais curto, eu ia como sempre maravilhado a ouvir as histórias do Baguinho, histórias de lances e de tantos pássaros ali abatidos, quase todos os cantos têm uma história, quase todos já tiveram um pássaro, quase todos têm, mesmo sem se ver o nome do Baguinho ali gravado. Não ia-mos a caçar, ia-mos até por um caminho discreto no meio do pinhal, eu, despreocupado e entusiasmado pelas historias que ia a ouvir nem estava a ligar ao cão, que pouco lhe importavam os contos do meu amigo, tinha sem duvida mais interesse nos pássaros de bico. Ouvimos os 2 um único toque do beeper, rapidamente olhamos para trás e ali perto o cão tinha parado um pássaro que saira ao beeper, incrivelmente para cima de nós, atiramos e cai a um disparo meu, que facilidade este abate, estávamos incrédulos, porque teria o pássaro saído para cima de nós e não para o lado contrário? Mais um enigma que rapidamente desvendamos, um “Talibã” estava no outro possível caminho de fuga, optando ela então por nos sair pelas costas, “talibã” este que levava pendurado um coelho e uma Galinhola presa pelo bico, não havia ali emoção nem respeito pela Dama, mas compreendo, nem todos têm de ter a mesma paixão que nós.
Baguinho sem mostrar qualquer indício de inveja ou desapontamento por não ter nenhum pássaro abatido pergunta-me onde eu achava que deveríamos ir?
Eu apenas tinha em mente uma pequena franja de Eucaliptal que me trazia boas memórias, com tão bom aspecto que na minha cabeça já imaginava mais um lance para um de nós, Baguinho hesitante lá aceitou a minha proposta, mas não sem dizer ao chegar á zona “detesto caçar nos Eucaliptais, isto não e próprio do pássaro” felizmente mordeu a língua, Rafael começa a remontar no local mais querençudo e vejo uma Galinhola sair á frente do cão e, já tapada Baguinho consegue um tiro certeiro de belo efeito. Seguiram-se as felicitações e instala-se um novo ânimo no companheiro. Não nos metemos ao caminho sem antes eu lhe dizer, “então eucaliptais não prestam…” como que intrigado responde-me “pois é Amigo Jorge, tinha razão!”
Decidimos ir dar água aos cães numa nascente escondida mas sempre útil, pelo caminho tivemos ainda um pássaro errado a meias que se evaporou.
Novamente um feeling meu, “Baguinho vamos fazer o lado contrário, pois ainda não o fizemos este ano!?” em consenso lá fomos, ainda bem que estava em dia de palpites certeiros, pois numa zona de mato alto, ladeada por fetos onde o Baguinho dizia “aqui é á francesa” porque em França se matam muitos pássaros nos fetos. O Rafael indiferente a cenários faz como sempre o seu trabalho, e pára uma Galinhola, desliza novamente, sinal que esta ia a pés e, volta a parar, pássaro no ar e um primeiro tiro errado, um segundo mal dado e um terceiro e ultimo para rematar e segurar o pássaro, Baguinho respirava fundo, eu no alto de um caminho apreciava o lance, um pássaro enorme e gordo, estávamos agora em igualdade, era merecido!
Decidimos então mudar de zona, dou um bocado de bolo mármore ao cão, um pouco de açúcar ajuda a recompor, pois tanto calor, pouca água e tanto terreno de tojo fortificado rebentam com qualquer cão, o Faruck estava também ele a desfrutar da jornada, cada vez que apanhávamos um corta fogo ele corria alegre, com aquele galope de cervídeo, saltitante demonstrava o seu contentamento. Mas o maior contentamento foi o meu pouco depois. Vejo o cão a remontar e a ficar em mostra, acerco-me dele e o beeper toca, o cão a dar ao rabo em câmara lenta dizia-me que o pássaro estava em movimento, um breve deslize de não mais de 1 metro e uma paragem firme, ela estava agora controlada, escolho a melhor posição e pouco depois o pássaro sai, como fundo a banda sonora do beeper e do meu próprio coração, um tiro certeiro e finava ali um lance que só por si valia a manhã, um lance que fazia valer a pena ter, treinar e cuidar 9 meses dos cães para apenas desfrutar com eles uns curtos 3 meses de caça.
Baguinho, mais acima apreciava o lance na sua totalidade, uns sinceros parabéns romperam o meu estado de euforia. Muita estética, beleza e firmeza, tinham transformado aquele lance em algo sobrenatural, algo impossível de descrever na sua mais pura essência, mas que me deu anos de vida!
Nada poderia terminar de outra maneira, sem que Baguinho tivesse também ele, o seu lance capital. Pouco menos de 50 metros, levantam-se 2 pássaros em simultâneo, um cai ao chão num único tiro certeiro, o outro pousa mas rapidamente é levantado pelos cães, Baguinho num momento de puro desportivismo aponta a um pássaro que lhe sai completamente á morte e, sem atirar diz, talvez ao pássaro, talvez à sua consciência, “não atiro, já tenho as minhas 3!” e num gesto de magnifico civismo e respeito pela Dama baixa a arma.
Um gesto que lhe dá junto com tudo o resto a faixa de “Becadero do Ano!”
Sabendo onde se encontrava a Dama, decidimos ir para o carro pelo aceiro mais proximo, para que os cães não importunassem mais nenhum pássaro! Afinal é para nos divertirmos não para chacinar.
Uma manhã produtiva, repleta de emoções, com a habitual dureza de terrenos ásperos que apenas estão disponíveis a cães especiais que jamais serão sepultados nas nossas memórias.
Á base de porco!
As minhas expectativas de um dia produtivo eram realmente fracas, sinceramente não pensava em mais do que acabou por acontecer!
Começámos a caçar numa zona que sinceramente não gosto, a zona tem o sargaço seco e demasiado fechado e algum pasto, havendo tão perto zonas com melhores qualidades, dificilmente uma Galinhola se enfiava ali! Aliás nunca ali matamos ou vimos uma Galinhola, o que me leva a não compreender as opções do grupo, mas em democracia as coisas funcionam assim, temos que respeitar a vontade da maioria, claro que aceitei a decisão sem o mínimo rancor e cacei com a habitual vontade como se estivesse num dos melhores locais da herdade. Inevitavelmente perdemos ali muito tempo sem ver um único pássaro!
Mudámos então de zona, para outra que também não me seduz. Aqui foi tudo á base de Javali, o Carlos logo de entrada teve o Prim parado com um enorme porco, que ainda deu uma cabeçada no cão, eu apenas ouvi o estrondo do encontrão e o ganir do cão, a navalhada foi mesmo de raspão tirando apenas o pelo da perna traseira, de uma forma tão perfeita que trabalho assim apenas está disponível ás mão de um dedicado barbeiro, ou de um porco com fraca pontaria, desta vez o cão teve sorte!
Pouco depois sai-me a mim outro porco enormíssimo, assim é complicado, os cães andavam desvairados, de cabeça no ar a parar porco aqui, porco ali, nem valia a pena perder mais tempo ali, O Carlos chamava fortemente pelo Prim, que estava ali tão perto parado com mais um Porco, eu lá vi o cão, tinha um porco pela frente e o Frick atrás a patronar que por sua vez tinha atrás de si o jovem Pointer filho do Faruck de 4 meses que também patronava os outros 2 e, sai mais um porco, eu dou um passo e sai-me debaixo dos pés um pequeno javali que se passeou á frente de todos nós. Assim não dava, os cães estavam estúpidos, não se fazia nada deles, cabeça no ar a ver se viam os porcos e desvairados a correr de um lado para o outro, era hora de sair dali rápido antes que houvesse problemas de maior.
Mudamos então de zona, para uma completamente incaracterística, montado despido, com uma ou outra pequena mancha de sargaço, dava parecenças a um grande mar salpicado de pequenos atóis desprovidos de vida devido ao seu reduzido tamanho. Eu pouco acreditava naquele terreno, para a lebre até era capaz, mas para Galinholas, hummm.
O Faruck como britânico que é cruzava o terreno a grande velocidade, pois a isso convidava, já no final da mancha e junto aos arames, o Faruck fica parado, o Beeper nem chega a tocar e uma Galinhola sai, estava num pequeno aglomerado de sargaço de não mais de 3 metros quadrados, que ladeava um velho sobreiro que tinha tatuado no corpo o numero 8, todos nós com os olhos tentamos seguir a trajectória até onde nos foi possível. Lá vamos todos tentar achar o pássaro, mas pouco depois foi errada pelo Mário que se apressou a dizer-nos “não devia ter atirado, ia larga” mas a caça tem destas coisa, atiramos quando não devemos e não atiramos em momentos oportunos, eu vi onde ela tinha ido e novamente todos no encalço da Dama, que se levanta novamente larga mais 2 vezes, acabando por morrer num tiro larguíssimo do Jorge, que inteligentemente tinha metido os canos de 71cm em vez dos habituais de 61 próprios para as Galinholas.
Seguiu-se um almoço rápido e em pé, fazendo de mesa o reboque do Mário, pois tínhamos muito terreno para fazer de tarde.
De tarde mais um pássaro errado pelo Carlos, que também ele dizia que não deveria ter atirado, pois esta vi eu, ia larguíssima, ás vezes quase por milagre, caem, não foi o caso, indico ao Mário que ia á minha direita a direcção dela, desta vez saiu-lhe até boa, mas lamentavelmente errou-a, assim como o Carlos que a errou vinda á frente do chumbo do Mário, esta não a vimos mais.
Mudámos então de local, para outro conhecido onde saiu um pássaro ao meu cão Frick, erro-a com um tiro algo largo e, não demos mais com ela. Se seguida o Prim para um pássaro que sai larga e acaba por morrer com um tiro largo do Jorge. Eu andava já noutra zona com a Uva, que me pára um porco enorme daqueles com crista nos costados ao género Punk, sai-me ainda um mais pequeno que deveria ser o escudeiro, mais uma vez a cadela ficou desvairada, era hora de findar a jornada.
Muito porco e pouco pássaro foi o resultado, Galinholas de levante poucas paradas e as que dão paragem, dão-no por pouco tempo. Espero a chuva com tanta ansiedade como um agricultor desesperado, espero que as cientificas e sábias previsões do Mário estejam correctas e que chova no fim-de-semana e que entre pássaro de quinta para sexta como ele prevê.
Com tudo combinado com a devida antecedência com o Jorge e o Baguinho, lá nos encontrámos todos há hora e local do costume. Baguinho com o Beeper e chocalhos na mão, tinha em seu redor, Rafa e Duque, que aos saltos e a ladrar pediam ao dono que lhes metesse o respectivo equipamento para começarem a faena, digo então ao meu amigo, “ainda dizem que os cães não gostam de caçar…” Baguinho sorri percebendo o que eu dizia.
Desta vez e para ser sincero as expectativas eram grandes, a chuva que caiu nestes dias, o vento forte e gelado era grande indicio de entrada de pássaros, para bom entendedor um bom vento basta para perceber muita coisa.
O início da mancha que por norma é o melhor mais uma vez foi fraco, apenas uma levantada larga ao Jorge, que se evaporava naqueles terrenos homogéneos.
Seguimos então caminho em direcção de um outro local, como aquela porção de terreno era estreita passei para a esquerda de um caminho deixando assim mais espaço para os companheiros. Sai-me então o primeiro pássaro, largo sem sequer meter a arma à cara tento acompanha-lo o mais que posso com os olhos. Como aquela zona é enorme e toda igual tento marcar no GPS muitas das zonas onde vejo um pássaro, as vezes que vou sem o Baguinho se não for este pequeno engenho electrónico a dizer-me onde estou, ando ali perdido sem saber onde piso. Enquanto marcava um ponto no GPS naquele local, sai-me um outro pássaro precisamente do mesmo sitio onde saíra a outra instantes antes, ainda faço um tiro complicado, segurando em simultâneo a arma e o GPS, errei-a, que coisa estúpida, será que a caça tem um sexto sentido para se furtar quando os caçadores estão a comer, ao telemóvel, de calças em baixo, ou neste caso a marcar um ponto no GPS, é que histórias destas são milhares todas as épocas. Também desta vez elas se evaporaram, pássaros de entrada, recentes no terreno e sem crença, a cada levante desaparecem.
Tive ainda uma mais errada de uma forma escandalosa, nem quero recordar até me dói o estômago só de pensar! Também o Jorge e o Baguinho tinham pássaros errados, todos com as suas desculpas, o sol, o mato, o pássaro, uma coisa é simples, erramo-las!
Era hora de ir ver de uns pássaros que sabíamos do seu paradeiro, o Baguinho numa zona que cheirava a pássaro faz um abate, o primeiro do dia, a coisa estava complicada, eu pensei e disse, “estava complicado, espero que tenha quebrado o enguiço!” Baguinho radiante segurava o pássaro com as mãos ainda tremulas típicas do primeiro abate do dia.
Fomos então ver de outra que o Jorge sabia a sua posição exacta, o Faruck rapidamente pega num rasto daquela forma típica de ter um pássaro à frente do nariz, o Jorge acerca-se rapidamente pois conhece bem o cão e conhecia o local, a galinhola furta-se ao cão e sai já entre mim e o cão, passando por cima dele, atiro e o pássaro cai, quando me viro vejo o Jorge também a tirar um cartucho vazio da arma, tinha atirado em simultâneo, apenas se ouviu um único disparo, de quem era o pássaro? O Jorge deu-ma a mim, tenho a certeza que o pássaro caiu ao meu disparo, mas não duvido que tenha também levado chumbo do Jorge, mais um enigma que a Dama nos deixa em mãos.
Pouco depois oiço o beeper do Faruck a tocar, corro lá mas depressa deixo de ouvir, não por se ter calado, mas porque os cães dos companheiros ao me verem correr, acompanham-me e os seus chocalhos ali ao lado dissipavam o som mais magnifico que pode haver, olho para o Jorge e ele indica-me onde estava o cão, ainda estava parado, mas depressa desmancha e segue no rasto, percebi que já tinha saído, ainda a parou mais 2 vezes sem que eu a visse, ia de levante à frente do cão, não fomos capazes de a ver mais.
Decidimos então ir dar água aos cães pelo percurso mais curto, um caminho que corta o pinhal, juntos de arma aberta, Baguinho e Jorge a comentar a jornada, eu ao telefone, grito “olha um pássaro” quem estava do outro lado do telefone sabe da minha loucura e não estranhou, outra pessoa certamente achava-me um louco. O pássaro passara altíssima por cima de nós, Baguinho diz, “linda, linda, olha que linda” realmente magnífica, a beleza de uma Galinhola a voar alta por cima das copas dos pinheiros é algo de difícil descrição e, de difícil compreensão para quem não tem qualquer afinidade com a Dama. Pousa pouco depois na zona que eu e o Jorge julgávamos, mas Baguinho duvidava e achava que ela estava num outro cantinho. A dar água aos cães ela sai, o Jorge manda-a a baixo numa zona de complicados e velhos fetos, rapidamente mandamos os cães cobrar, que de molho na nascente saciando a sede não a viram cair. Eu pensando para comigo duvidava do sucesso deste cobro, embrenhamo-nos nos fetos incentivando os cães, o tempo passava e nada, Baguinho dizia, “já estou sem pé” pois só víamos as cabeças uns dos outros, cães para um lado, cães para outro e nada de pássaro, muito tempo e esforço despendemos a tentar recuperar aquela Galinhola, mas infelizmente sem sucesso.
De realçar algo que me deixa muitas vezes impressionado, a forma de pensar do Jorge, os muitos anos e as centenas de lances e abates, deram-lhe um conhecimento profundo sobre esta caça, sabe sempre onde procurar, sabe sempre qual a melhor zona para ter um pássaro, o que para uns é um feeling, para outros, um acaso, para ele é uma simples certeza, fruto de horas infindáveis atrás da Bela Dama.
12 levantes a pássaros diferentes e 3 abates foram o resultado da jornada, poucos lances daqueles que gostamos, com o cão em primeiro plano, ansiamos a chuva como nunca, para que os pássaros assentem e deixem trabalhar os cães até ao fim, este inicio de época está duro com muitos pássaro e poucos abates, bem dentro do espírito becadero.
Que tarde, que lance.
Ainda a quente por dentro, gelado e meio molhado por fora relato aqui mais uma curta jornada ás Galinholas, bem curta numa tarde chuvosa, entre uma ou outra aberta, mas com a inevitável chuva.
A convite do Jorge lá fui fazer um fim de tarde ás Galinholas, era para ser a partir das 14.30h, hora combinada, mas começou mais tarde apenas quando a chuva nos deu tréguas.
Saímos para o campo em busca de dois pássaros avistados dias antes, saí com a Uva, desta vez deixei o Faruck em casa pois caçou ontem e levou uma coça daquelas. Infelizmente hoje eu com a Uva e o Jorge com uma cadela que já foi minha e agora é novamente dele, a Shepa não fizemos nenhum levante naquela zona.
Como já era tarde decidimos fazer uma zona conhecida ali perto, pois não tardava e metia-se a noite, pois nesta altura vem demasiado cedo.
Escolho agora o Frick para fazer o final da jornada, seguimos então em direcção de terrenos conhecidos, ali que eu, quer o Jorge sabemos onde metemos os pés. Mal começamos o Jorge relembra-me algo que eu não esquecera, uma manchazinha de pinheiros onde ele no outro ano tinha lá feito um abate, “atenção aí nesses pinheiros marcados já matei um pássaro!”, mas este ano ou para já nada havia, seguimos então deixando os carros pelas costas, separados por um caminho no meio do pinhal, cada um fazia um dos Talhões. Pouco depois ouço um disparo mais que esperado, numa zona onde também na época passada lá tinha tombado uma, o Onil fica parado e o Jorge abate um pássaro, sinceramente já contava até estranhei a demora, a zona é quente e com muita crença!
Do meu lado as coisas não estavam fáceis, não me imaginava ali com nenhum pássaro, demasiado pasto deitava por terra qualquer hipótese de ter um pássaro, mas continuei sempre com a restia de esperança de poder estar ali um pássaro de entrada que vindo de longe tenha poisado num daqueles bocadinhos mais apetitosos, infelizmente nada, filos todos e nada, mas tudo na vida tem a sua recompensa. Pouco depois meti o cão numa zona onde na época passada o Onil tinha parado um pássaro que o Jorge errara, tendo sido parada e cobrada pela cadela que agora é minha a Uva. É um bocado pequeno mesmo no final da mancha com crença, mas nada nem um rasto, restava-me agora uma zona por demais querençuda, um velho pinheiro manso que ladeia um caminho e que tem como vizinhos uns matos tão ao gosto do pássaro que senti que ali poderia estar um pássaro. Sem demoras salta uma Galinhola ao Frick que sem duvidas ia fazer um salto de peixe, mas que porque o cão correu atrás abriu um pouco mais as asas e afastou-se mais do que pretendia, chamo então o cão para fazer-mos bem o contorno do pinheiro, podia estar outra, mas não estava! Vou então na direcção que achava possível, rapidamente o Frick com aquele narizão, muito superior ao do Faruck, pega no rasto, e a galope faz o caminho por onde a Dama tinha pisado, eu a perceber e a antever o que se estava a passar, corro o mais que posso atrás do cão, mas não o consegui acompanhar, ele é muito mas muito mais rápido que eu, vejo-o a subir uma pequena ladeira e a Galinhola a sair mesmo à frente dele, o cão a tapar o pássaro não me possibilitou o tiro, digo para mim uma daquelas asneiras possantes, extravasando assim a minha raiva e angustia por não ter ainda conseguido matar um pássaro a este cão. O quanto eu queria e precisava de matar uma pássaro nas beiças do cão para ele “abrir” e pela quarta vez que não o conseguia. Mas Deus por vezes escreve direito por linhas tortas, o que se seguiu deixou-me num estado de total êxtase, estado esse que ainda me encontro. Passo então um caminho e subo um pouco uma elevação do terreno, o cão mais rápido passa para o outro lado e deixo de o ver, quando chego ao cimo, não ouvia o chocalho, vejo-o pouco abaixo no meio de uns matinhos e tojos, chamo-o ele não se mexe, percebi então que estava parado, corro e ao acercarme o cão desmancha a paragem, ela estava certamente por ali mas a furtar-se, com aquele nariz não é fácil deixa-lo para trás, rapidamente ele mete o nariz no chão e remonta até ficar novamente parado, um trabalho rapidíssimo típico de um cão de grande nariz e feito nas Galinholas, diga-se que nariz tem e muito, mas galinholas tem apenas 3 trabalhadas. Tinha agora o meu Frick ali ao meu lado parado com uma Galinhola, que imagem, que beleza, o pássaro sai entre uns pinhos e é abatido ao primeiro tiro. Ainda trémulo liga-me o Jorge que ao ouvir o tiro me pergunta pelo telemóvel, “caiu”!? Eu respondo eufórico “Sim caiu e, num lance brutal!!!”
Finalmente consegui um lance daqueles que marcam e com o canotas, nome que por vezes aqui em casa lhe chamamos por mimo, ele tinha-me dado um lance que jamais esquecerei, um lance bem trabalhado bem finalizado e de extrema beleza, pois é um cão com muita plástica e extremamente belo quando em mostra.
Obrigado Jorge!